quinta-feira, 23 de dezembro de 2010


Cuba

Raul Castro: O socialismo é a única garantia para continuarmos sendo livres e independentes


● Discurso proferido pelo presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros, general-de-exército Raúl Castro Ruz, no Sexto Período Ordinário de Sessões da Sétima Legislatura da Assembleia Nacional do Poder Popular, efetuado no Palácio das Convenções, em 18 de dezembro de 2010, "Ano 52 da Revolução".
(Tradução das versões estenográficas do Conselho de Estado)

NESTA ocasião, o discurso vai ser um pouco mais longo que os anteriores, mas esta foi realmente uma sessão da Assembleia excepcional pelos temas debatidos, pelas opiniões expressas por vocês e pelos documentos aprovados.

Quando me dirigia para esta Assembleia, vi no jornal a data 18 de dezembro, e em seguida, veio a minha memória um simples fato histórico: há exatamente 54 anos, não pensávamos viver tanto nesse momento, nas circunstâncias em que nos encontrávamos, o nascente Exército Rebelde, as atuais Forças Armadas Revolucionárias e a Revolução em si mesma, que depois do desastre e da grande derrota num lugar conhecido como Alegría de Pío, três dias depois do desembarque, em 5 de dezembro desse mesmo ano, durante 13 dias, em pequenos grupos, tentando passar os dois cercos imediatos que nos colocaram, finalmente, ajudados pelos camponeses, aderi ao pequeno grupo de Fidel.

O encontro foi à noite. Depois do abraço inicial, afastou-me e a primeira pergunta que me fez foi: "Quantos fuzis vocês traz?" "Cinco", respondi; "E mais dois que eu tenho, são sete. Agora sim ganhamos a guerra!" (Aplausos). E ao que parece, ele tinha razão.

É uma feliz coincidência, e quis começar o discurso final desta atividade com tão grata lembrança.

Companheiras e companheiros:

Há uns dias estamos reunidos debatendo assuntos transcendentais para o futuro da nação. Nesta ocasião, além do habitual trabalho das comissões, os deputados participaram da sessão plenária com o objetivo de analisar os detalhes da situação econômica atual, bem como as propostas ao orçamento e ao plano da economia para o ano 2011.

Os deputados dedicaram também muito tempo a avaliar com profundidade e a esclarecer dúvidas e inquietações sobre o Projeto de Lineamentos da Política Econômica e Social do Partido e da Revolução.

Nossos meios de comunicação divulgaram largamente o desenvolvimento destes debates, a fim de facilitar a informação à população.

Apesar da incidência dos efeitos da crise mundial na economia nacional, do comportamento instável das precipitações durante 19 meses, desde novembro de 2008 até junho deste ano, e sem excluir erros próprios, posso afirmar que o cumprimento do plano de 2010 foi satisfatório levando em conta os tempos que vivemos. Será atingido o crescimento de 2,1% do Produto Interno Bruto, conhecido por suas siglas PIB; aumentaram as exportações de mercadorias e serviços, sem terminar este ano já se atingiu a cifra prevista de visitantes estrangeiros, embora não sejam novamente cumpridas as receitas, consolida-se o equilíbrio financeiro interno e, pela primeira vez em vários anos, começa a se constatar uma dinâmica favorável, ainda que limitada, na produtividade do trabalho em comparação com o salário médio.

Continuam a diminuir as retenções de transferências para o exterior, isto é, as restrições que tivemos a obrigação de impor no final de 2008 nos pagamentos, a partir dos bancos cubanos, aos fornecedores estrangeiros, as quais serão completamente suprimidas no ano próximo, e também, tivemos avanços significativos na renegociação da dívida com nossos principais credores.

Gostaria agradecer novamente a confiança e compreensão de nossos parceiros comerciais e financeiros, aos quais ratifico o mais firme propósito de honrar pontualmente os compromissos contraídos. O governo deu instruções precisas de não contrair novas dívidas sem a certeza de cumprir os pagamentos nos prazos acertados.

Como explicou o vice-presidente do governo e ministro de Economia e Planejamento, Marino Murillo Jorge, o plano do ano próximo prevê um crescimento do PIB de 3,1%, que deverá ser alcançado em meio a um cenário também complexo e tenso.

O ano 2011 é o primeiro dos cinco incluídos no projeto em médio prazo de nossa economia, período em que, a pouco e pouco, serão introduzidas mudanças estruturais e de conceitos no modelo econômico cubano.

No ano próximo, continuaremos reduzindo decididamente os gastos supérfluos, promovendo a poupança de recursos, a qual, como já disse em várias oportunidades, é a fonte de receitas mais rápida e segura de que dispomos neste momento.

Da mesma maneira, não vamos descurar, senão elevar a qualidade dos programas sociais nos setores da saúde, da educação, da cultura e do esporte, onde se constataram enormes reservas de eficiência no uso mais racional da infraestrutura existente. Além disso, incrementaremos as exportações de bens e serviços, ao passo que continuaremos dedicando os investimentos àquelas atividades com mais rápida recuperação.

Quanto ao plano e ao orçamento, enfatizamos que é necessário pôr fim a essa história dos inadimplementos e giros sobreexcedidos. O plano e o orçamento são sagrados. Repito, desde já, o plano e o orçamento são sagrados e são elaborados para serem cumpridos, não para nos conformarmos com quaisquer justificativas e até com imprecisões e mentiras, premeditadas ou não, quando as metas não são cumpridas.

Às vezes, alguns companheiros, sem propósito fraudulento, fornecem informações inexatas de seus subordinados sem antes comprová-las e mentem inconscientemente, mas esses dados falsos podem-nos levar a tomar decisões erradas com maior ou menor repercussão na nação. Quem agir assim, também mente e seja quem for, será destituído definitivamente y não provisoriamente do cargo que ocupa e, depois da análise dos organismos correspondentes, será também expulso das fileiras do Partido, se for membro dele.

A mentira e seus efeitos nocivos acompanham o homem desde que aprendeu a falar em épocas remotas, motivando a repulsa da sociedade. Devemos lembrar que nos dez mandamentos bíblicos, o número oito dispõe: "Não devemos dar falso testemunho nem mentir". Da mesma maneira, os três princípios éticos morais fundamentais da civilização inca estabeleciam: não mentir, não roubar, não ser vadio.

Vou repetir estes princípios que ainda hoje aplicam os descendentes dos incas: não mentir, não furtar e não ser vadio. São corretos esses três princípios, pois não? Vamos tentar lembrá-los.

É preciso lutar para erradicar a mentira e o engano da conduta dos dirigentes de qualquer nível. Não debalde, Fidel, em sua brilhante definição do conceito Revolução assinalou, entre outras questões: "Jamais mentir nem violar princípios éticos". Conceitos que aparecem refletidos na primeira página dos Lineamentos que estivemos debatendo, no folheto que foi impresso.

Após a publicação do Projeto de Lineamentos da Política Econômica e Social em 9 de novembro passado, o 6º Congresso do Partido já está em debate, pois o verdadeiro congresso será a discussão aberta — como já se está fazendo — de seus enunciados com os militantes e todo o povo, o qual, em genuíno exercício democrático, o enriquecerá e, sem excluir opiniões discordantes, conseguiremos consenso nacional sobre a necessidade e urgência de introduzir mudanças estratégicas no funcionamento da economia, com o propósito de tornar sustentável e irreversível o socialismo em Cuba.

Não devemos temer das opiniões divergentes e esta orientação, que não é nova, não deve ser interpretada como circunscrita ao debate sobre os Lineamentos. As opiniões divergentes, expressas no lugar adequado, no momento oportuno e de maneira correta, sempre serão mais acertadas do que a falsa unanimidade, baseada na simulação e no oportunismo. É, aliás, um direito do qual ninguém se deve privar.

Enquanto mais ideias sugerirmos na análise de um problema, estaremos mais próximos da solução adequada.

A Comissão de Política Econômica do Partido e os onze grupos que a integraram, trabalharam durante muitos meses na elaboração dos supracitados Lineamentos que, como se explicou, serão o tema central do Congresso, partindo da convicção de que a situação econômica é a tarefa principal do Partido e do governo e a disciplina básica dos dirigentes em todos os níveis.

Durante os últimos anos, enfatizamos que não podíamos cair em improvisações nem tomar decisões às pressas nesta área, levando em conta a magnitude, complexidade e as inter-relações das decisões a adotar. Por isso acho que foi bom adiar o Congresso do Partido, apesar de resistirmos pacientemente aos reclamos honestos e também mal-intencionados dentro e fora de Cuba para que apressássemos a adoção de muitas medidas. Como era de esperar, nossos adversários no exterior impugnaram cada passo que demos, primeiro os desqualificaram como cosméticos e insuficientes, agora tentam confundir a opinião pública prenunciando o fracasso certo e enfocam suas campanhas na exaltação do presumível desencantamento e ceticismo com que nosso povo acolheu este projeto.

Às vezes, parece que suas ânsias mais íntimas lhes impedem ver a realidade. Evidenciando suas verdadeiras pretensões, exigem de nós sem rodeios desmontar o regime econômico e social que conquistamos, como se esta Revolução estivesse disposta a se submeter à mais humilhante rendição, ou a reger seu destino por condicionamentos degradantes.

Ao longo de 500 anos, desde Hatuey até Fidel, nosso povo derramou muito sangue, e agora não vai aceitar o desmantelamento das conquistas conseguidas com tanto sacrifício. (Aplausos)

É bom recordar outra vez àqueles que têm essas ilusões infundadas as palavras expressas neste Parlamento em 1º de agosto de 2009. E cito: "Eu não fui eleito presidente para restaurar o capitalismo em Cuba nem para entregar a Revolução. Fui eleito para defender, manter e continuar aperfeiçoando o socialismo, não para destruí-lo", (Aplausos) fim da citação.

Hoje acrescento que as medidas que estamos aplicando e todas as modificações que sejam necessárias fazer para a atualização do modelo econômico, estão encaminhadas para a preservação do socialismo, seu fortalecimento e torná-lo verdadeiramente irrevogável, como ficou estabelecido na Constituição da República, a pedido da imensa maioria de nossa população em 2002.

É preciso examinar toda a informação e os argumentos que fundamentam cada decisão, e de passagem, suprimir a tendência excessiva ao segredo, ao qual nos acostumamos durante mais de 50 anos de bloqueio econômico. Um Estado sempre guardará logicamente em segredo alguns assuntos. Isso ninguém duvida, mas não as questões que definem o curso político e econômico da nação. É essencial explicar, fundamentar e convencer o povo da justeza, necessidade e urgência de uma medida, por muito dura que for.

O Partido e a Juventude Comunista, bem como a Central dos Trabalhadores de Cuba e seus sindicatos, junto às demais organizações de massa e sociais, têm a capacidade de mobilizar o apoio e a confiança da população mediante o debate, sem sujeição a dogmas e padrões inviáveis, que constituem uma barreira psicológica colossal, que é imprescindível desmontar a pouco e pouco e vamos consegui-lo entre todos nós. (Aplausos)

Esse é precisamente o conteúdo fundamental que reservamos para a Conferência Nacional do Partido, que se realizará em 2011, depois do Congresso, numa data que será marcada mais em diante. Nela, analisaremos, entre outras questões, as modificações aos métodos e estilos de trabalho da organização partidária, uma vez que, em conseqüência das deficiências apresentadas no trabalho dos órgãos administrativos do governo, o Partido teve que se envolver ao longo dos anos, no exercício de responsabilidades que não lhe cabiam, o qual limitou e o comprometeu sua condição de vanguarda organizada da nação cubana e força dirigente superior da sociedade e do Estado, consoantemente com o artigo n.o 5 da Constituição da República.

O Partido deve dirigir e controlar e não interferir nas atividades do governo, em nenhum nível, que é a quem cabe governar, cada qual com suas próprias normas e procedimentos, segundo suas missões na sociedade.

É preciso mudar a mentalidade dos dirigentes e de todos os compatriotas para encarar o novo cenário que se vem apresentando. Trata-se simplesmente de mudar conceitos errados e insustentáveis sobre o socialismo, muito enraizados durante anos em amplos setores da população, como conseqüência do excessivo enfoque paternalista, idealista e igualitário instituído pela Revolução em prol da justiça social.

Muitos cubanos confundem o socialismo com as gratuidades e subsídios, a igualdade com o igualitarismo, e muitos consideram a caderneta de racionamento uma conquista que não deve ser suprimida.

A respeito disso, tenho certeza de que vários problemas que hoje enfrentamos tem sua origem nesta medida de distribuição, que embora estivesse incentivada em certo momento pelo são empenho de garantir ao povo o abastecimento estável de alimentos e outras mercadorias, em oposição ao abarcamento inescrupuloso de alguns com fins lucrativos, é expressão evidente de igualitarismo, que beneficia tanto os que trabalham quanto os que não o fazem, ou que não precisam dela, gerando práticas de troca e revenda no mercado negro, etc.

A solução deste complexo e sensível assunto não é simples, pois tem estreita relação com o fortalecimento do papel do salário na sociedade e isso será apenas possível se reduzirmos gratuidades e subsídios ao passo que elevarmos a produtividade do trabalho e a oferta de produtos à população.

Nesta questão bem como na redução do quadro de pessoal inflado, o Estado socialista não deixará desamparado nenhum cidadão e garantirá, por meio do sistema de previdência social, que as pessoas impedidas de trabalharem recebam a pensão mínima requerida. No futuro existirão subsídios, mas não aos produtos, mas para os cubanos que por algum motivo o necessitem.

Como é sabido, desde o mês de setembro, foi eliminada a distribuição racionada de cigarros, artigo que apenas uma parte da população recebia e que, como é óbvio, por seus nocivos efeitos para a saúde, não é um produto de primeira necessidade.

No ano próximo — e já se falou nisto nos debates — não poderemos nos dar ao luxo de despender quase US$50 milhões — exatamente US$47 milhões — em importação de café para manter a cota que é distribuída até hoje a todo o povo pela caderneta, incluindo aos recém-nascidos. Prevê-se, por ser uma necessidade imperiosa, como se fazia até o ano 2005, misturá-lo com ervilha, muito mais barata que o café, que custa quase US$3 mil uma tonelada, enquanto a outra tem um preço de US$390.

Por tanto, se quisermos continuar tomando café puro e sem racionamento, a única solução é produzi-lo em Cuba, onde foi demonstrado que existem as condições propícias para seu cultivo, em volumes suficientes que satisfaçam a demanda e até exportá-lo com a mais alta qualidade.

Depois da guerra de agressão norte-americana ao Vietnã, o heroico e invicto povo vietnamita pediu ao nosso país que o ensinasse a cultivar café, e lá foi o pessoal, ensinou-o e transmitiu-lhe nossa experiência. Hoje, o Vietnã é o segundo exportador de café do mundo. E um funcionário vietnamita dizia a um colega cubano: "Como é possível que vocês, que ontem nos ensinaram a cultivar café, agora nos comprem?" Não sei que respondeu o cubano. Com certeza, disse-lhe: "O bloqueio."

Tais decisões e outras que serão necessárias aplicar, apesar de não serem populares, são imprescindíveis para poder sustentar e até melhorar os serviços gratuitos da saúde pública, educação e previdência social para todos os cidadãos.

Fidel, em seu histórico discurso de 17 de novembro de 2005, expressou, e cito: "Uma conclusão que tirei após muitos anos é que, entre os muitos erros cometidos por todos nós, o mais crasso foi acreditar que alguém sabia de socialismo ou que alguém sabia como construir o socialismo", fim da citação. Há apenas um mês, depois de cinco anos, Fidel, através de sua mensagem por ocasião do Dia Internacional do Estudante, no encontro com vários deles, ratificou esses conceitos que continuam tendo vigência.

Por meu lado, lembro a intervenção de um agraciado cientista soviético que, há cerca de meio século — na época em que foi o primeiro homem ao cosmos, que foi Gagarin —, considerava que, apesar de se ter documentado teoricamente a possibilidade do homem ir ao espaço, não deixava de ser uma viagem ao desconhecido.

Embora tenhamos contado com o legado teórico marxista-leninista, onde foi cientificamente demonstrada a factibilidade do socialismo e a experiência prática das tentativas de sua construção noutros países, a edificação da nova sociedade na nova ordem econômica é também, a meu ver, uma viagem ao desconhecido. Por tal motivo, cada passo deve ser analisado com profundidade e planejado antes de dar o próximo, onde os erros sejam reparados de maneira oportuna e rápida para não deixarmos a solução ao tempo, que apenas vai acrescentá-los e afinal, serão ainda piores.

Temos pleno conhecimento dos erros que cometemos e, precisamente, os Lineamentos em debate marcam o início do caminho da retificação e da necessária atualização de nosso modelo econômico socialista.

Ninguém se deve enganar. Os Lineamentos mostram o caminho para o futuro socialista, adequado às condições de Cuba, não ao passado capitalista e neocolonial derrubado pela Revolução. O planejamento e não o mercado livre será a característica da economia e é proibida, conforme recolhe o terceiro dos lineamentos gerais, a concentração da propriedade. Tudo fica bem claro. O pior cego é aquele que não quer ver.

A construção do socialismo deverá ser conforme as peculiaridades de cada país. É uma lição histórica que aprendemos muito bem. Não pensamos mais copiar ninguém. Isso nos trouxe muitos problemas e porque, acima de tudo, copiamos mal. Mas não ignoramos as experiências de outros e aprendemos com elas, inclusive com as positivas dos capitalistas.

Examinando a necessária mudança de mentalidade, vou pôr um exemplo: se já chegamos à conclusão de que o exercício do trabalho por conta própria é mais uma opção de emprego para os cidadãos em idade de trabalho visando elevar a oferta de bens e serviços à população e livrar o Estado dessas atividades para se dedicar ao verdadeiramente importante, o que cabe ao Partido e ao governo fazer é facilitar sua administração e não gerar estigmas nem preconceitos contra eles, e para isso é fundamental que muitos de nós mudemos nossa opinião negativa a respeito desta forma de trabalho privado. Os clássicos do marxismo-leninismo, ao se referirem às características da construção da nova sociedade, determinaram, entre outras, que o Estado, em representação do povo, manteria a propriedade sobre os meios de produção fundamentais.

Nós absolutizamos esse princípio e passamos quase toda a atividade econômica do país para a propriedade estatal. Os passos dados e que daremos na ampliação e flexibilização do trabalho por conta própria, são fruto de profundas análises e posso lhes assegurar que, desta vez, não vamos recuar.

Por sua parte, a Central dos Trabalhadores de Cuba e os respectivos sindicatos nacionais estão analisando as formas e métodos para organizar a atenção a esta força de trabalho, promover o cumprimento estrito da Lei e tributos e motivar nestes trabalhadores a rejeição às ilegalidades. Devemos defender seus interesses — repito —, devemos defender os interesses dos trabalhadores por conta própria, bem como fazemos com qualquer outro cidadão, sempre que cumpram as normas jurídicas aprovadas.

Nesse sentido, tem grande importância a introdução nos diversos níveis do ensino dos conceitos básicos do sistema tributário com o objetivo de familiarizar, de maneira permanente e concreta, as novas gerações com a aplicação dos impostos como a forma mais universal de redistribuição da renda nacional, com vista a sustentar as despesas sociais, incluindo a ajuda aos mais necessitados.

Em escala da sociedade, devemos fomentar os valores cívicos de respeito e cumprimento por parte dos contribuintes de suas obrigações tributárias, criar nas pessoas essa cultura e disciplina, e gratificar os que cumprem e sancionar a sonegação de impostos.

Outra tarefa na qual falta muita coisa por fazer, apesar dos avanços, é a atenção às diversas formas produtivas na agricultura, de modo a eliminar os muitos entraves existentes para potenciar as forças produtivas em nossos campos e que, conforme a poupança na importação de alimentos, os agricultores obtenham receitas justas e razoáveis por seu duro trabalho, fato que não justifica que imponham preços elevados à população.

Dois anos depois de iniciar a entrega de terras sem cultivar em usufruto, considero que temos condições para avaliar a entrega de áreas adicionais, acima dos limites estabelecidos pelo Decreto-Lei 259, de julho de 2008, àqueles produtores agropecuários com resultados relevantes no uso intensivo dos solos sob sua responsabilidade.

É bom esclarecer que as terras entregues em usufruto são propriedade de todo o povo, por tal motivo, se fossem futuramente necessárias para outros usos, porque são necessárias para a construção de uma obra social, de uma rodovia, ou qualquer outra, o Estado compensaria aos usufrutuários o que investiram e lhes daria o valor das obras.

No momento certo, após terminarmos os estudos, a partir das experiências que vamos ganhando, apresentaremos ao Conselho de Estado as correspondentes propostas de modificação do mencionado Decreto-Lei, onde os camponeses têm seu representante, que é precisamente Lugo Fonte, presidente da Associação Nacional de Pequenos Agricultores.

Uma das barreiras mais difíceis de ultrapassar na criação de uma visão diferente, e assim devemos reconhecê-lo, é a ausência de uma cultura econômica na população, inclusive em muitos dirigentes, os quais, mostrando grande ignorância na matéria, ao enfrentarem problemas cotidianos adotam ou propõem decisões sem refletir num só instante nos efeitos e despesas que geram, nem tampouco se existem no plano recursos e no orçamento para isso.

Não é novidade quando digo que, em geral, improvisar e particularmente na economia, leva ao fracasso, apesar dos bons propósitos.

Em 2 de dezembro passado, por ocasião do 54º aniversário do desembarque do iate Granma, o órgão oficial do nosso Partido reproduziu um excerto do discurso proferido por Fidel em 1976, nessa mesma data, quando se comemoravam apenas 20 anos daquele acontecimento e que, por sua vigência, considero oportuno citar:

Há 34 anos, Fidel dizia: "A força de um povo e de uma revolução consiste precisamente em sua capacidade de compreender e enfrentar as dificuldades. Apesar de tudo, avançaremos em inúmeros setores e lutaremos com afinco para elevar a eficiência da economia, poupar recursos, reduzir gastos desnecessários, aumentar as exportações e criar em cada cidadão uma consciência econômica. Com antecedência, eu disse que todos nós somos políticos, agora acrescento que todos nós devemos ser economistas, não economicistas, que não é a mesma coisa uma mentalidade de poupança e eficiência do que uma de consumo", fim da citação.

Economistas não quer dizer que agora todos nós tentemos conseguir um diploma de economista; pois há suficientes. Quer dizer, dominar os princípios da economia, não fazer doutoramento em economia.

Fidel continuava afirmando: "... agora acrescento que todos nós devemos ser também economistas e, repito, economistas, não economicistas, pois não é a mesma coisa uma mentalidade de poupança e eficiência do que uma mentalidade de consumo", fim da citação.

O coração destes Lineamentos que vocês têm e a precisão da orientação do desenvolvimento econômico que neste momento é, produzir o que se pode exportar, poupar importações e investir nas obras de mais rápida recuperação e, além disso, elevar a eficiência da economia. Poupar recursos, reduzir gastos não essencias — nestes dias falamos em tudo isso —, aumentar as exportações e criar em cada cidaão uma consciência econômica "e repito, economistas, não economicistas, que não é a mesma coisa uma mentalidade de poupança e eficiência do que uma mentalidade de consumo", fim da citação. Isso foi em 2 de dezembro, há 34 anos.

Dez anos depois, em 10 de dezembro de 1986, durante a sessão do 3º Congresso do Partido, Fidel expressou, cito: "Muita gente não entende que o Estado socialista, que nenhum Estado, nenhum sistema pode dar o que não tem, e ainda menos vai ter se não produz; se estão dando dinheiro sem respaldo produtivo. Tenho certeza de que o quadro de pessoal inflado, o excesso de dinheiro entregue à gente, os inventários inúteis, o esbanjamento, têm muito a ver com o grande número de empresas não rentáveis existentes no país…" fim da citação.

Após 34 e 24 anos, respectivamente, dessas duas citações que eu fiz, e destas orientações do líder da Revolução, esses e mais outros problemas persistem.

Bom, e que fizemos? Por que não foram cumpridas as instruções ou orientações do líder da Revolução? Aplaudimos os discursos, gritamos Viva a Revolução, e depois tudo ficava na mesma.

Ele fez o que lhe cabia, e eu tento achar uma explicação e expresso que Fidel, com sua genialidade, ia abrindo e mostrando o caminho, e os demais não soubemos garantir e consolidar o avanço em prol desses objetivos.

Faltou-nos, na verdade, coesão, apesar da unidade do povo em torno de seu Partido, de seus dirigentes, de seu governo, nossa arma estratégica fundamental para poder sobreviver mais de cinco séculos, numa fortaleza sitiada, face ao mais poderoso império que tenha existido na história. Mas faltou-nos coesão, organização e coordenação entre o Partido e o governo; em meio às ameaças e urgências cotidianas descuramos o planejamento em médio e longo prazo, não fomos suficientemente exigentes diante de violações e erros de tipo econômico cometidos por alguns dirigentes e também demoramos em retificar decisões que não tiveram o resultado previsto, porém sobreviveram.

Em mais de uma ocasião, e aqui mesmo, neste Parlamento, referi-me a que nesta Revolução quase tudo já foi dito e que devemos rever quais orientações de Fidel cumprimos e quais não, desde sua enérgica alegação "A História me Absolverá" até hoje. Resgataremos as ideias vigentes de Fidel e não permitiremos que isso aconteça novamente. Daí, as instruções e a linha, que marcaram o Partido e o governo sobre erros, violações, etc. Se quisermos salvar a Revolução, será preciso cumprirmos os acordos, e não permitir depois do Congresso — como aconteceu até agora em muitos casos muito eloquentes — que os documentos fiquem guardados eternamente nas gavetas, como alguns explicaram aqui nestes dias de discussões frutíferas, democráticas e verdadeiramente profundas. É assim como queremos que o povo continue debatendo esses Lineamentos. Dispõe de cerca de 100 dias para isso. Ou nós retificamos ou já acabou o tempo de continuarmos bordejando o despenhadeiro, e afundamos, e com isso afundaremos, como dissemos com antecedência, o esforço de gerações inteiras, desde o índio Hatuey, que chegou aqui da que é hoje a República Dominicana e o Haiti — o primeiro internacionalista em nosso país — até Fidel, que nos conduziu genialmente por estas situações tão complicadas desde o triunfo da Revolução (Aplausos).

Nunca esqueçamos, os menos jovens, ou os que temos mais idade, mas continuamos sendo jovens e estamos travando batalha (Aplausos), e as novas gerações também — das quais ontem discursaram eloquentemente alguns — as palavras do discurso inicial de Fidel assim que chegou à capital, no quartel principal de Batista, antiga Columbia, hoje escola Ciudad Libertad. Ele disse neste lugar: "A Revolução triunfou, a alegria é imensa, mas ainda falta muito por fazer. Não nos enganemos pensando que, desde já, tudo será fácil, talvez tudo seja agora mais difícil." E essa orientação precisa e vaticinadora tornou-se realidade ao longo de mais de cinquenta anos.

Não era um caminho de rosas, nós sabíamos a força que enfrentaríamos, apenas contando com o povo e com o armamento, que foi tirado a Batista, depois continuamos munindo-nos como foi possível, até hoje, e fomentado e educado também por ele, a grande unidade que tem nosso povo, que sempre devemos cuidar como nossos olhos, como nossa própria vida. Mas essa unidade não pode ser por decreto; teremos mais unidade, porque será do conhecimento de todos, se forem aplicados métodos absolutamente democráticos em todo o desenvolvimento político da nação, desde um grupo de base do Partido até o órgão supremo do poder do Estado, que é esta Assembleia que está reunida aqui, tranquilamente.

Temos um país instruído, com alto nível de instrução, e temos muitas coisas positivas, grandes avanços, que não adianta agora mencionar nesta atividade. Nossa imprensa fala muito a respeito disso, dos grandes avanços da Revolução, nos discursos também nos referimos a isso; mas é preciso irmos ao miolo do assunto, como fizemos nesta sessão da assembleia do Parlamento.

Quer dizer, as questões que analisamos e os erros que criticamos não podem se repetir, está em perigo a existência da Revolução.

Texto: / Postado em 22/12/2010 ás 08:39

Um comentário:

  1. O único avanço que o nosso país precisa ter e imediatamente é o cumprimento da lei de maneira que todos os infratores vão para a cadeia. Essa lei que cada um dos criminosos leva seus próprios ingredientes, o resultado sempre será uma enorme pizza.

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